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Boletim Editorial 8

No período de 2 a 8 de outubro, os editoriais da grande imprensa abordaram as temáticas listadas na Figura 1. Consideramos, para análise mais específica em nosso boletim, as três posições mais frequentes.

Por Juliana Gagliardi, Eduardo Barbabela, Lidiane Vieira e João Feres Júnior

No período de 2 a 8 de outubro, os editoriais da grande imprensa[1] abordaram as temáticas listadas na Figura 1. Consideramos, para análise mais específica em nosso boletim, as três posições mais frequentes. A primeira é compartilhada por dois eixos: economia e administração pública. Na segunda posição, Bolsonaro e a reforma da Previdência. Em terceiro lugar, Lula, a Amazônia e o cenário político peruano.

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Figura 1: Temáticas presentes nos editoriais (2/10 a 8/10/2019)

Nesta semana, economia esteve mais uma vez no topo dos eixos temáticos mais frequentes, aparecendo n’O Estado de S. Paulo (OESP) e n’O Globo. OESP[2] aborda o fraco desempenho econômico do país e indica ser um grave problema o processo de desindustrialização em curso. O governo é criticado por não ajudar a resolver o quadro e o jornal sugere que, para isso, é preciso boa gestão, políticas claras, expectativa de crescimento, financiamento suficiente e juros toleráveis para que a indústria cresça.[3] Mesmo com o diagnóstico e as críticas ao desempenho do governo, OESP defende, em outro editorial, que o crescimento sustentado está sendo realizado pelo Banco Central e que os resultados aparecerão.[4]

No âmbito comercial, o jornal paulista aborda os resultados do comércio mundial argumentando que são péssimos para o Brasil e, novamente, critica o presidente, opinando que podem piorar com a atuação de Bolsonaro batendo de frente com a comunidade internacional.[5] O Globo chama atenção para a queda das exportações brasileiras e o mal que isso representa para um país com a economia debilitada, destaca o cenário de guerra comercial EUA-China e valoriza a voz do FMI.[6] Em outro texto, focado no estado do Rio de Janeiro, o jornal carioca saúda a realização de megaeventos como o RIR porque injetam dinheiro na economia, especialmente no setor hoteleiro e de turismo e chama Witzel e Crivella a se inspirarem nisso, já que o Rio vem perdendo espaço no setor.[7]

No segundo eixo temático, administração pública, destaca-se o subtema privatização, presente em OESP e O Globo. O primeiro elogia a desestatização da economia e as privatizações, criticando a demora e a falta de ação do governo, mas otimista quanto a isso no futuro breve.[8] O Globo afirma que há muito mais empresas federais do que se previa e defende a privatização para que se possa sanar a dívida pública, indicando que “o maior obstáculo a um amplo e necessário programa de privatização é político”. [9] Em outro editorial, o jornal do Rio promove a ideia de que organizações sociais entrem na administração das universidades e que haja flexibilização nos contratos de trabalho e argumenta que, numa crise fiscal, “não é saudável para o ensino superior público depender apenas da disponibilidade financeira da União e de estados.”[10] Em crítica ao governo, defende que Weintraub modere o tom do seu discurso – que tem sido ideológico – para colaborar com as discussões sobre o futuro do ensino superior.

Além da privatização, outros três subtemas aparecem. A Folha acusa o Governo Federal de aparelhamento ideológico da Caixa Econômica, censurando temáticas que não são caras aos apoiadores do governo, como os universos feminista e homossexual e as críticas ao golpe de 1964.[11] No nível regional, O Globo falou do conflito entre Crivella e Witzel para não terem que se responsabilizar por dois hospitais públicos que, anteriormente estaduais, foram cedidos ao município em 2016. Crivella argumenta que os repasses de verbas não foram feitos e explicita intenção de devolvê-los ao estado, enquanto Witzel evita reassumi-los. O jornal destaca o gasto que representam por ano, mas conclui dizendo que há que se buscar um consenso pelo bem da população atendida.[12] No que diz respeito ao terceiro subtema, em abordagem histórica à lei de improbidade administrativa, OESP recomenda que ela seja aprimorada, já que tem dificultado a atuação de pessoas honestas na administração pública sem excluir dela os administradores corruptos.[13]

A segunda posição no ranking foi compartilhada por dois eixos temáticos: a reforma da Previdência e Bolsonaro. A reforma apareceu nos editoriais dos três jornais. A Folha lamentou o afrouxamento de normas na tramitação no Senado e a redução de 14% da economia esperada, criticou a fragilidade do governo nos debates do Congresso e reforçou, mais uma vez, que, ainda assim, a reforma é um “passo expressivo no processo de reequilíbrio do Orçamento federal”.[14] OESP também critica a atuação do governo e a inabilidade do presidente, mas chega a especular que talvez seu afastamento da tramitação tenha sido positivo para garantir a votação e os ganhos da reforma.[15] O Globo, assim como a Folha, nota as “desidratações” que o projeto sofre no Senado e, mais uma vez, justifica a defesa e inevitabilidade da medida sob o argumento da insustentabilidade do sistema brasileiro com os gastos de aposentadorias e pensões.[16]

No que diz respeito mais centralmente a Bolsonaro, esse eixo também aparece nos três jornais. No entanto, só a Folha centra editorial nas recentes acusações de irregularidades na campanha. O jornal aborda o escândalo sobre o uso de laranjas pelo Partido Social Liberal (PSL), destacando que novos depoimentos vinculam o dinheiro do caixa dois desse escândalo às contas de campanha de Bolsonaro e de Marcelo Álvaro Antônio, atual ministro do Turismo. O editorial critica a reação de Bolsonaro (“destemperado”) e do governo ameaçando a Imprensa. Críticas sobram também para Sérgio Moro pelas incongruências com o passado.[17] Em OESP, a crítica ao presidente aparece pela sua fidelidade à militância. O texto critica Bolsonaro por defender que suas políticas públicas são propostas que vem dos anseios populares, enquanto ouve, na verdade, suas redes sociais com militantes virtuais extremistas – uma irresponsabilidade cometida por quem deveria governar democraticamente para todos.[18] Já O Globo critica a lenta resposta do governo às manchas de óleo que aparecem em praias do Nordeste há um mês e que só agora Bolsonaro ordenou que sejam investigadas. Ressalta, portanto, que o governo não nutre simpatia pelas questões de meio ambiente.[19]

Nesta semana, ocupam o terceiro lugar, em frequência de aparição nos editoriais da grande imprensa, Lula, a Amazônia e a política peruana. Lula é criticado com requinte em OESP e O Globo. O primeiro aborda a carta na qual Lula sugere que recusará a progressão de pena para o regime semiaberto, argumentando que o ex-presidente quer uma lei só para ele e deve desculpas ao país por desmoralizar a política, escarnecer das leis e banalizar a corrupção.[20] O Globo também critica a decisão de Lula de recusar o regime semiaberto e ridiculariza comparações feitas entre o ex-presidente e Mandela. Para O Globo, Lula se vitimiza e é passível de crítica o tom político adotado por ele e seus advogados. O jornal conclui que “a decisão do ex-presidente de não sair da cadeia desrespeita a Justiça, o que é parte de um projeto”.[21]

A crise amazônica é outro eixo temático desta semana. Embora o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, tenha comemorado dados sobre a redução das queimadas em setembro, a Folha narra com desconfiança a posição do Governo.[22] Em O Globo, fala-se sobre a persistência das ameaças à Amazônia, embora a “redução de queimadas e ida de soldados para a região deram falsa ideia de que crise estava controlada”.  O jornal carioca também destaca mais uma vez, como em semanas anteriores, o risco que esse quadro representa para o agronegócio, “o setor mais dinâmico da economia brasileira, fortemente exportador”.[23]

O último eixo temático da terceira posição é a política peruana, tema que vinha aparecendo em editoriais de semanas anteriores, mas sem alcançar as posições de maiores frequências. A Folha aborda a questão a partir do impasse político que incluiu troca de presidentes, Congresso dissolvido e eleições antecipadas no país, e aponta como origem da crise o “pleito geral de 2016, que fraturou a relação entre Legislativo e Executivo, e [os] desdobramentos de um escândalo de corrupção envolvendo a empreiteira brasileira Odebrecht”.[24] O jornal paulista termina destacando os desdobramentos perigosos desse cenário para o funcionamento da democracia peruana. O Globo segue caminho semelhante, descrevendo a crise institucional vivida naquele país, com denúncias de corrupção na política e no Judiciário, dissolução do Congresso, e também coloca a Lava Jato peruana na raiz da questão. Mas ao fim, o jornal carioca destaca o desfecho de alto custo que isso terá na economia peruana.

Conclusão

Como se vê mais uma vez, economia e administração pública são eixos temáticos sempre presentes nos editoriais da grande imprensa. De modo geral, a crítica ao peso do Estado e  o estímulo às privatizações são frequentes. A reforma da Previdência continua uma bandeira vigiada e defendida.

 Enquanto na semana passada a Lava Jato brasileira foi defendida, nesta semana processo semelhante na política peruana foi apontado como raiz de uma grave crise política e institucional no país andino, embora sem que se aprofunde essa crítica ou se faça comparações com o caso brasileiro. Em O Globo, continua sobressaindo o enquadramento econômico, seja para considerar as consequências da crise amazônica ou da crise peruana.

Diferentemente das semanas anteriores, as críticas a Bolsonaro tiveram espaço menor desta vez – apareceram, mas sem ocupar a primeira posição. Com o aprofundamento da crise do PSL e as denúncias sobre caixa dois na campanha, observemos se isso mudará na próxima semana.

[1] Para este boletim, consideramos 52 editoriais publicados por Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e O Globo.

[2] Indústria em busca da virada, O Estado de S. Paulo (OESP), 2/10/2019.

[3] O PIB requer mais estímulo, OESP, 4/10/2019.

[4] Terraplanismo fiscal, OESP, 6/10/2019.

[5] Perigo no mercado global, OESP, 3/10/2019.

[6] Declínio das exportações revela fragilidade do país, O Globo, 7/10/2019.

[7] Rock in Rio confirma importância de uma agenda de grandes eventos, O Globo, 4/10/2019.

[8] O ‘Estado empresário’, OESP, 7/10/2019.

[9] O tamanho do Estado-empresário, O Globo, 8/10/2019.

[10] Professores universitários sob a CLT, O Globo, 6/10/2019

[11] Caixa às bruxas, Folha de S. Paulo (FSP), 6/10/2019.

[12] Recusa da prefeitura e do estado a assumir hospitais avilta população, O Globo, 3/10/2019

[13] Lições da improbidade, OESP, 8/10/2019.

[14] Revés na reforma, FSP, 3/10/2019.

[15] O parto da Montanha, OES, 3/10/2019.

[16] Reforma da Previdência não é desprezível, O Globo, 4/10/2019.

[17] Laranja indigesta, FSP, 8/10/2019.

[18] Populismo virtual, OESP, 8/10/2019.

[19] A lenta resposta do governo às manchas de óleo no Nordeste, O Globo, 8/10/2019.

[20] O repto de Lula, OESP, 2/10/2019

[21] É risível comparar a prisão de Lula com a de Mandela, O Globo, 2/10/2019.

[22] Queima de fogos, FSP, 6/10/2019.

[23] Continuam as ameaças à Amazônia, O Globo, 3/10/2019.

[24] Democracia tensionada, FSP, 3/10/2019.

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