M Facebook: O caso das joias de Bolsonaro
OBJETIVO
O relatório em questão tem como objetivo compreender a repercussão do caso da tentativa do ex-presidente Jair Bolsonaro de trazer joias ilegalmente da Arábia Saudita em páginas do Facebook.
METODOLOGIA
Foi realizada uma coleta por termos (ver Nota 1) na plataforma Crowdtangle, a partir de publicações de páginas do Facebook que ocorreram durante o mês de março (dia 1 a 31). A partir disso, serão apresentadas: – Métricas: correspondem aos dados quantitativos e descritivos referentes às principais informações das publicações (volume de publicações, recursos, principais publicadores etc.). – Nuvem de palavras: elaboradas através do total de publicações de cada seção, serão destacadas as palavras de maior relevância em relação ao evento e com maior número de menções. – Análise de narrativas: une a análise das 5 publicações com maior quantidade de interações com uma análise exploratória do ranking completo da publicações por quantidade de interação, de forma a identificar as pautas e narrativas que mais repercutiram e mais se repetiram, sendo essas acompanhadas de exemplos de publicações.
1. Visão Geral
Essa seção apresenta as métricas gerais das publicações coletadas no período total do estudo, de 1 a 31 de março de 2023. Analisamos o volume de publicações e interações por dia e por tipo de página, assim como os principais recursos utilizados. Os dados gerais do estudo podem ser observados abaixo:
| Páginas | 3.616 |
|---|---|
| Tipos de página | 200 |
| Publicações | 17.671 |
| Interações | 4.646.150 |
1.1 Total de publicações
A partir do gráfico abaixo, percebe-se que o assunto teve seus primeiros picos na rede nos dias 4 (1.374 publicações) e 6 de março (1.721), se mantendo aquecido até o dia 10. Tal período corresponde à cobertura inicial do caso, especialmente alavancado quando a Receita Federal acionou o Ministério Público Federal (MPF) para apuração do fato, no dia 4. O caso volta a ter alguma repercussão entre os dias 13 e 15 de março, quando o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou prazo de cinco dias para que Jair Bolsonaro devolvesse os itens. Entretanto, a repercussão ocorre em um volume muito menor, em torno de 600 publicações por dia, mesmo volume do dia 24, quando Bolsonaro devolve as joias e armas recebidas. No dia 28 é observado um último pico, devido à descoberta de um terceiro conjunto de joias que teria sido recebido pelo ex-presidente, sendo este mais alto que os últimos (934 publicações), mas ainda menor e por menos tempo do que o inicial.
1.2 Total de interações
Em relação às interações geradas pelo conteúdo analisado, observa-se que acompanharam os picos de publicações com certa proporcionalidade. O maior volume foi registrado no dia 4 (662.177 interações), seguido pelos dias 5 e 6 (cerca de 450-480 mil interações), mantendo o tema aquecido até o dia 10, com média de 300 mil interações. Enquanto os dias 13 a 15 registraram média de 110 mil interações, o aumento das publicações no dia 24 não foi acompanhado por crescimento proporcional nas interações (70 mil). Já no dia 28, as publicações geraram 255.210 interações, tendo destaque o dia 30 que, apesar de um volume de posts similar ao dia 15, resultou em maior interação (255.740), provavelmente impulsionado pela volta de Jair Bolsonaro ao Brasil.
1.3 Publicações por tipo de página
Dos 200 tipos de página existentes na amostra, os 20 que mais publicaram (listados no gráfico abaixo) produziram 15.407 publicações, correspondente a 87,2% do total. Nota-se uma forte cobertura midiática do evento, com as páginas de notícias (ex. news site, media news company, topic newspaper etc.) ocupando a maior parte das posições do ranking. O tema também foi explorado pelo setor político (politician, political organization e political party) e por influenciadores digitais (personal blog, digital creator, person etc.).
1.4 Interações por tipo de página
Os 20 tipos de páginas listados abaixo produziram um total de 4.353.168 milhões de interações, correspondente a 93,7% do total de interações do período. Os destaques são as categorias de políticos (politician) e pessoas (person), a primeira liderando o ranking, mesmo que com 1/3 do total de publicações das categorias de media news company e news site, e a segunda com mais de 500 mil interações com apenas 331 publicações.
1.5 Páginas com maior interação
A partir da análise das 10 páginas que obtiveram maior quantidade de interações nas publicações sobre o caso das jóias, percebe-se que se sobressaíram páginas de veículos de mídia (UOL Notícias, CNN Brasil, Globo News e Rádio Band News FM), além de figuras vinculadas à esquerda. A segunda categoria é composta, primeiramente, por parlamentares, nomeadamente Humberto Costa ( PT-PE), Lindbergh Farias (PT-RJ) e Alencar Santana (PT-RJ); segundo, por duas páginas de influenciadores digitais alinhados ao governo Lula, Elisiario Maximus e Almeida; e também Suderlan de Castro, ativista e empresário também alinhado ao governo. Essas páginas geraram, juntas, 1.498.000 interações, correspondente a 32,2% do total.
1.6 Recursos utilizados
Em relação aos recursos empregados, mais da metade do conteúdo (52,5%) sobre o tema corresponde a links. A maioria dessas publicações são provenientes de páginas de mídia, e os links referentes a notícias, porém também compartilhadas, especialmente, por figuras e outras páginas políticas. O segundo recurso principal utilizado foi o de fotos (32,4%), que aparece com uma maior diversidade de usos, ao exemplo de prints de notícias e de tweets, memes e montagens apresentando fatos relacionados ao caso. O uso de recursos visuais na rede permite chamar maior atenção para o conteúdo publicado, e para o fato/ideia que se quer transmitir.
2. Análise do conteúdo
Essa seção visa analisar o conteúdo relacionado ao tema produzido entre os dias 1 e 31 de março de 2023. Para isso, primeiramente será observado o conteúdo das publicações com maior interação no período, e, em seguida, serão identificados os principais temas e narrativas presentes, através de uma nuvem palavras com o conteúdo de todas as publicações combinada de uma análise exploratória da amostra.
2.1 Posts com maior número de interações
| Página | Data | Interações | Compartilhamentos | Link | |
|---|---|---|---|---|---|
| 1 | Alencar Santana | 4 mar. | 114.685 | 29.047 | https://www.facebook.com/AlencarBraga13/videos/1431197140965986/ |
| 2 | Elisiario Maximus – Página | 7 mar. | 97.462 | 16.191 | https://www.facebook.com/ElisiarioMaximus/videos/928064141972866/ |
| 3 | Pedro Uczai | 3 mar. | 60.727 | 15.875 | https://www.facebook.com/PedroUczai/videos/1724685997992498/ |
| 4 | Jessé Sangalli | 7 mar. | 58.271 | 31.248 | https://www.facebook.com/JesseSangalli/videos/1267868687418343/ |
| 5 | Jornal da Record | 23 mar. | 50.477 | 4.648 | https://www.facebook.com/JornalDaRecord/videos/747543053639208/ |
Em relação às cinco publicações com maior quantidade de interações, a primeira diz respeito a um vídeo de matéria da Rede Globo explicando o caso das joias e a investigação por possível crime de corrupção passiva. A segunda corresponde a um vídeo compilando falas de deputados federais, como Ivan Valente (PSOL-SP) e Tarcísio Motta(PSOL-RJ) em plenária da Câmara, sobre o escândalo das joias de Jair Bolsonaro, que aparecem em contraposição à fala de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) sobre a invasão dos Três Poderes de 8 de janeiro e supostos infiltrados petistas que seriam responsáveis pelos atos. A terceira apresenta um vídeo de reportagem do Jornal Nacional detalhando as tentativas frustradas do governo Bolsonaro de retirar as jóias, apontado na publicação como “escândalo”. A quarta posição fica com o vereador de Porto Alegre, Jessé Sangalli (CIDADANIA/RS) e diz respeito a um vídeo seu falando sobre joias e obras de arte que teriam sido encontradas em cofre com presentes ganhos por Lula na presidência, não teriam sido declarados e estariam no acervo pessoal de Marisa Letícia, ex-esposa de Lula. A partir disso, faz um contraponto para defender Jair Bolsonaro e Michelle, afirmando que o caso seria uma tentativa da “extrema imprensa” de manchar a imagem do ex-presidente. Por fim, a quinta publicação, de período do mês diferente das outras (23 de março), apresenta trecho de entrevista exclusiva de Jair Bolsonaro à Record TV, falando a respeito de seu retorno ao Brasil, a invasão em Brasília e o caso das joias. Sobre as joias, o ex-presidente afirmou que só teve conhecimento do caso um ano depois, uma vez que não esteve presente nesta visita à Arábia Saudita, que havia uma liminar que o permitia manter os presentes, sendo a única condição não vendê-los, e que iria entregar os itens, tanto as joias quanto as armas recebidas.
2.2 Principais temas e narrativas
Para analisar os principais temas e narrativas, relacionados ao caso das joias, que dominaram a rede no mês de março, observamos os termos que mais apareceram nas publicações, de acordo com a nuvem de palavras abaixo. Tiveram destaque acima de mil menções: Bolsonaro (15.065 menções), Joia (14.098), Arábia (3.359) e Saudita (4.915), presente (4.685), Michelle (3.251) e Primeira-Dama (1.473), Receita (3.857) Federal (5.058), ministro (2.938), milhões (2.385), diamante (2.122), polícia (1.753), Lula (1.390), itens (1.248), relógio (1.225), Bento (1.223) Albuquerque (1.323), Tribunal (1.133), crime (1.045), ilegalmente (1.031) e aeroporto (1.010).
A partir da observação das publicações com maior repercussão durante o período, destacaram-se três eixos centrais de narrativas:
1) Culpabilização de Jair Bolsonaro
As narrativas associadas a este grupo de publicações divulgam o ocorrido como um “escândalo” (palavra que aparece 663 vezes nos posts) e são capitaneadas por figuras políticas de esquerda (muitas do PT), jornalistas específicos, influenciadores e outras páginas associadas ao campo da esquerda, apesar de também vir de outros perfis, como da ex-deputada Joice Hasselmann. A partir disso, abordam alguns pontos centrais. Primeiro, pressionam para que haja responsabilização e consequências para Jair Bolsonaro incluindo pedidos de explicação do ex-presidente sobre o caso, pressão para a devolução do itens e para a prisão de Bolsonaro. Segundo, apresentam o caso como crime e uma tentativa de roubo dos itens pelo ex-presidente, o associando à corrupção. Vale destacar que a descoberta de um terceiro pacote de joias, no final de março, reforça a narrativa de ilegalidade do caso. Nessa mesma linha, grande parte das publicações associa Michelle Bolsonaro ao caso, muitas vezes relembrando o caso dos cheques recebidos pela ex-primeira-dama de Fabrício Queiroz. Terceiro, se referem ao caso como um esquema de propinas (sendo o termo mencionado 456 vezes), especialmente a partir da ideia compartilhada pelo ministro da SECOM Paulo Pimenta (link), alegando que as joias recebidas poderiam ser uma propina em troca da privatização da refinaria Landulpho Alves (Rlam), na Bahia, que pertencia à Petrobras e foi vendida ao fundo árabe Mubadala Capital depois de uma viagem de Jair Bolsonaro para o Oriente Médio.
Exemplos:
https://www.facebook.com/watch/live/?ref=watch_permalink&v=3256603641336324
https://www.facebook.com/watch/?v=603369495163856
https://www.facebook.com/watch/?v=606900394640120
- Defesa de Jair Bolsonaro
As narrativas associadas a estas publicações são provenientes, principalmente, de figuras políticas, influenciadores e veículos de mídia alinhados a Jair Bolsonaro e buscam defender a inocência do ex-presidente em relação ao caso. Primeiro, justificam o caso, afirmando que Bolsonaro só soube do ocorrido um ano depois, uma vez que nem sequer estaria na visita quando os itens foram recebidos, e sim alguns de seus ministros. Essa foi a mesma explicação dada pelo ex-presidente, adicionando que não seria proibido que mantivesse os itens e que a única regra seria não vendê-los. Segundo, alegam que o caso estaria sendo explorado pela mídia e pela esquerda para manchar a imagem de Bolsonaro, além de fazer uma cortina de fumaça para esconder o que consideram ser o “desastre” do governo atual. Terceiro, afirmam que nos governos petistas anteriores, de Lula e Dilma Rousseff, os mandatários teriam mantido algumas centenas de presentes recebidos em seus acervos pessoais, o que diminuiria qualquer gravidade do caso das joias de Bolsonaro, que teria sido muito mais insignificante, chegando também a ser comentada a necessidade de melhor regulamentação para tratar sobre presentes recebidos por agentes públicos.
Exemplos:
https://www.facebook.com/watch/?v=612527747385172
https://www.facebook.com/watch/?v=229826942917891
https://www.facebook.com/watch/?v=1314784949089097
3) Cobertura midiática
Uma vez que o caso foi publicizado pela própria mídia, a partir de matéria do O Estado de S. Paulo, a cobertura se modificou, sendo o caso agora tratado como situação polêmica (1) ou até mesmo como escândalo por alguns veículos (2), com muitos ressaltando o caráter ilegal do ocorrido. Além de noticiar os desenvolvimentos do caso e de sua investigação, divulgaram-se áudios, vídeos e documentos relacionados e transmitiram-se entrevistas com o ex-presidente sobre o caso, especialmente quando da sua volta ao Brasil. Cabe destacar que algumas publicações associadas a jornalistas e comentaristas específicos aparecendo tendendo mais para o ponto 1 (por exemplo, Leonardo Sakamoto do UOL) ou 2 (Paulo Polzonoff Jr. da Gazeta do Povo), conforme a segunda sessão de exemplos abaixo.
https://www.facebook.com/watch/?v=807883777223003
https://www.facebook.com/watch/?v=601225261458110
https://www.facebook.com/watch/?v=102779452764733
https://www.facebook.com/watch/?v=1170029190364375
https://www.facebook.com/watch/?v=3032762307029295
Nota 1: Termos utilizados na busca
(joias OR diamante OR diamantes OR receita federal) AND (bolsonaro OR michelle OR michele OR saudita OR sauditas OR piquet OR presente OR presentes OR presenteado OR apreendidas OR ilegais OR ilegalmente OR arabes OR ladrão OR contrabando OR contrabandeou)
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