PNR #044 – Formalização de Inquérito contra Bolsonaro
O relatório tem como objetivo compreender a repercussão nas redes sociais da formalização do inquérito contra Jair Bolsonaro, no Supremo Tribunal Federal. A análise incide sobre as páginas públicas que compartilharam posts, entre os dias 1 e 22 de fevereiro, filtradas pelo termo de busca “Bolsonaro”, em posts que obtiveram destaque no Brasil. A coleta de dados foi realizada por meio da plataforma SOMAR, nas bases do Facebook e do Instagram.
O relatório está dividido em três seções: análise de dados do Facebook, análise de dados do Instagram e conclusões
PRINCIPAIS DESCOBERTAS
Narrativas divergentes: A direita trata a denúncia como perseguição política, defendendo a viabilização da anistia e a revogação da Lei da Ficha Limpa. No campo da esquerda, a etapa é definida como um passo essencial para a defesa da democracia.
Redes sociais como arena de disputa: O embate sobre Bolsonaro vai além do meio jurídico e se fortalece nas redes, onde diferentes grupos disputam narrativas e buscam influenciar a opinião pública a seu favor.
1. FACEBOOK
Tabela 1. Dados Gerais
Publicações | 986 |
Total de páginas que postaram | 217 |
Interações | 5.317.403 |
Tabela 2. Total de interações por tipo de publicação nos 20 perfis com maior número de interações
Ideologia | Perfil | Albuns | Link | Fotos | Status | Video | Total Geral |
Direita | jairmessias.bolsonaro | 6.625 | 53.282 | 54.656 | 170.420 | 284.983 | |
Imprensa | jornaloglobo | 92.217 | 177.535 | 269.752 | |||
Esquerda | gleisi.hoffmann | 62.425 | 87.755 | 150.180 | |||
Imprensa | UOLNoticias | 148.405 | 148.405 | ||||
Esquerda | senadorhumberto | 81.704 | 58.024 | 139.728 | |||
Direita | biakicisoficial | 15.404 | 102.245 | 117.649 | |||
Direita | magnomalta | 36.686 | 74.275 | 110.961 | |||
Direita | jovempannews | 2.214 | 15.889 | 26.273 | 55.665 | 100.041 | |
Imprensa | metropolesdf | 9.260 | 5.054 | 48.282 | 27.809 | 90.405 | |
Direita | deltandallagnol | 7.469 | 5.373 | 46.807 | 21.994 | 81.643 | |
Direita | carlosjordyoficial | 34.192 | 35.504 | 69.696 | |||
Direita | newsatuall | 2.104 | 66.225 | 68.329 | |||
Imprensa | cnnbrasil | 44.273 | 23.235 | 67.508 | |||
Esquerda | MidiaNINJA | 66.190 | 66.190 | ||||
Direita | ZambelliOficial | 8.628 | 52.230 | 60.858 | |||
Direita | flaviobolsonaro | 58.867 | 58.867 | ||||
Direita | gazetadopovo | 31.023 | 27.729 | 58.752 | |||
Imprensa | folhadesp | 5.187 | 4.043 | 15.260 | 34.111 | 58.601 | |
Imprensa | jornaldocommercioPE | 47.876 | 47.876 | ||||
Imprensa | g1 | 33.449 | 10.954 | 54.656 | 170.420 | 44.403 |
Ao observarmos a cobertura, notamos que a direita conquistou o maior número de páginas e de reações às publicações. Foram 10 páginas deste campo, contra 3 de esquerda. Em relação a reações, foram 1.011.779 interações nas páginas de direita, contra 356.098 reações nas da esquerda.
Figura 1. Total de interações por tipo de perfil nos 20 perfis com maior número de interações

Figura 2. Clusters das publicações sobre o tema

A imagem exibe uma distribuição de pontos coloridos em um gráfico de dispersão, onde cada cor representa um cluster diferente. Cada ponto simboliza um item de conteúdo ou um resumo de notícia que foi agrupado com base em similaridades temáticas ou textuais.
A análise dos clusters revela uma polarização política marcada em torno da figura de Jair Bolsonaro, com os textos agrupados segundo diferentes enfoques narrativos e valências ideológicas. Além disso, a disposição dos clusters no gráfico sugere possíveis correlações espaciais com o conteúdo e o tom dos textos — indicando que os quadrantes podem representar dimensões latentes do discurso político, como intensidade da crítica, tom acusatório, ou defesa explícita.
O Cluster 0 está situado majoritariamente no quadrante inferior esquerdo e apresenta uma abordagem mais ampla e moderada. Ele combina menções a denúncias e aparições sociais de Michelle Bolsonaro, com repercussões públicas nas redes, mas sem aprofundar ou tomar partido de forma explícita. Seu conteúdo é informativo, com valência mista — há tanto fatos negativos sobre Bolsonaro quanto neutralidade ao relatar ações sociais e eventos públicos. A posição periférica e abaixo dos eixos pode sugerir um discurso menos polarizado e de menor intensidade ideológica.
O Cluster 1, também no hemisfério esquerdo, mas levemente mais central, aprofunda-se nas investigações conduzidas pelo STF e pela PGR. Embora traga menções factuais, o tom é predominantemente crítico, especialmente ao relatar os possíveis desdobramentos jurídicos para Bolsonaro, como sua inelegibilidade e possível prisão. A ênfase nas instituições e figuras como Alexandre de Moraes aproxima esse cluster de uma narrativa jurídica contundente, ainda que institucionalizada.
Já o Cluster 2 está posicionado no quadrante direito, em uma zona centralizada, e revela uma tensão entre denúncia e defesa. Embora relate as acusações de tentativa de golpe, dá espaço à versão da defesa de Bolsonaro, que nega os fatos e aponta perseguição política. Essa ambivalência o posiciona como um cluster de valência ambígua, que tanto informa quanto relativiza as acusações. Sua localização sugere uma busca por equilíbrio ou até mesmo um ponto de inflexão no discurso — não tão crítico, mas também não abertamente favorável.
O Cluster 3 ocupa a região central do gráfico, o que é coerente com sua função discursiva: contextualizar os eventos nacionais dentro de um cenário mais amplo, incluindo referências a lideranças internacionais como Donald Trump e Elon Musk. O tom é mais analítico e estratégico, buscando mapear os desdobramentos políticos futuros. A valência, nesse caso, é mista, com leve inclinação crítica, mas sem agressividade. Sua centralidade pode indicar uma tentativa de neutralidade narrativa.
O Cluster 4, localizado no quadrante superior esquerdo, é fortemente crítico. Ele gira em torno das delações de Mauro Cid e de investigações sobre uso indevido de recursos públicos, além de possíveis manipulações eleitorais. O conteúdo é dominado por denúncias robustas e detalhadas, e o tom é de acusação direta. A posição no quadrante superior, associada a uma valência altamente negativa, pode indicar um discurso intensamente opositor ao bolsonarismo.
Em contraste, o Cluster 5 se posiciona no quadrante superior direito e representa o polo oposto. Aqui, o tom é marcadamente pró-Bolsonaro, com defesa direta do ex-presidente e críticas abertas ao STF, ao governo Lula e às acusações judiciais. É onde a polarização se revela de forma mais explícita, funcionando quase como uma trincheira discursiva da direita política. A localização no quadrante mais distante e superior reforça essa ideia de militância e antagonismo intenso.
Por fim, o Cluster 6, ainda no hemisfério superior, ocupa uma posição central-direita e serve como espaço de elaboração de estratégias jurídicas e contra-narrativas. O tom aqui é defensivo, mas sem o confronto direto do Cluster 5. Aponta para uma tentativa de blindagem institucional e questionamento das provas, mas com um discurso mais técnico e menos ideológico. A posição do cluster sugere uma defensiva articulada e sofisticada, próxima do núcleo de sustentação política e jurídica de Bolsonaro.
Em suma, a combinação entre análise temática e espacial mostra não só uma diversidade de narrativas sobre Jair Bolsonaro, mas também uma possível organização implícita do discurso político nos quadrantes do gráfico. Os clusters mais críticos tendem a se agrupar no hemisfério esquerdo, enquanto os de defesa e apoio se concentram à direita. Essa disposição reforça a ideia de polarização discursiva, que não se manifesta apenas no conteúdo, mas também na estrutura espacial das representações.
A sobreposição entre os clusters sugere interseções temáticas, refletindo a complexidade do cenário político brasileiro e a convergência entre debates jurídicos, midiáticos e eleitorais.
2. INSTAGRAM
Tabela 3. Visão geral dos dados
Publicações | 3.953 |
Total de páginas que postaram | 905 |
Interações | 52.787.648 |
Tabela 4. Top 20 perfis com maior número de interações
Orientação ideológica | Perfil | Total de Curtidas | Total de Comentários | Total de Interações |
Direita | jairmessiasbolsonaro | 1.828.473 | 87.591 | 1.916.064 |
Direita | revistaoeste | 1.707.922 | 101.269 | 1.809.191 |
Esquerda | midianinja | 1.570.226 | 47.778 | 1.618.004 |
Direita | conexaopoliticabrasil | .1472.794 | 82.683 | 1.555.477 |
Direita | lucaspavanato | 1.341.771 | 47.622 | 1.389.393 |
Imprensa | metropoles | 1.058.942 | 298.068 | 1.357.010 |
Imprensa | folhadespaulo | 699.152 | 212.674 | 911.826 |
Direita | jovempannews | 784.968 | 107.012 | 891.980 |
Direita | plenonews | 817.074 | 52.124 | 869.198 |
Imprensa | globonews | 732.587 | 117.344 | 849.931 |
Imprensa | metropolespolitica | 654.982 | 191.109 | 846.091 |
Direita | bolsonarosp | 795.202 | 49.874 | 845.076 |
Direita | deltandallagnol | 781.484 | 52.224 | 833.708 |
Direita | firminocortada | 770.296 | 47.853 | 818.149 |
Direita | gazetadopovo | 665.313 | 85.434 | 750.747 |
Direita | vodograu_reserva | 690.325 | 17.179 | 707.504 |
Fofoca | alfinetei | 665.024 | 37.451 | 702.475 |
Fofoca | leodias | 632.815 | 62.856 | 695.671 |
Direita | flaviobolsonaro | 630.134 | 29.719 | 659.853 |
Esquerda | icl.noticias | 560.078 | 36.444 | 596.522 |
No Instagram, a direita também venceu a disputa, com doze perfis contra dois da esquerda.
No total de interações (Figura 3), a vantagem também é para o campo da direita, com 13.046.340 interações, contra 2.214.526 da esquerda. Os perfis de esquerda ficaram atrás até mesmo das páginas da imprensa.
Figura 3. Total de interações por tipo de perfil nos 20 perfis com maior número de interações

Figura 4. Clusters das publicações sobre o tema

O gráfico de dispersão apresenta uma estrutura visual dos agrupamentos temáticos em torno do ex-presidente Jair Bolsonaro. Cada cluster reúne conteúdos textuais semelhantes, organizados segundo temas recorrentes e afinidades discursivas. No entanto, para compreender verdadeiramente a polarização presente nos dados, é fundamental analisar não apenas os temas dominantes, mas também como esses temas se posicionam no espectro ideológico — se os textos manifestam apoio, crítica ou ambiguidade em relação a Bolsonaro — e como se distribuem no espaço gráfico, cujos eixos parecem corresponder a dimensões latentes de posicionamento político, intensidade retórica e orientação narrativa.
O Cluster 0, localizado predominantemente no quadrante inferior esquerdo, é fortemente crítico. Ele gira em torno da denúncia apresentada pela PGR sobre uma tentativa de golpe de Estado, baseada nas delações de Mauro Cid. A narrativa enfatiza a gravidade institucional dos fatos e a ameaça à democracia. A posição no gráfico, combinando valores baixos de X e Y, sugere um discurso crítico e institucionalizado, sem apelo ideológico inflado — ou seja, crítica racional e jurídica.
O Cluster 1, levemente mais central mas ainda no hemisfério esquerdo, mistura elementos críticos com abordagens ambíguas. Ele traz à tona homenagens recebidas por Bolsonaro e sua reação pública às denúncias, junto a discussões sobre sua possível busca de asilo. Embora os fatos sejam narrados com alguma neutralidade, há espaço para críticas e também para a defesa. Sua posição gráfica sugere um cluster de ambiguidade moderada, em que a polarização é abordada, mas não necessariamente tomada como partido.
Já o Cluster 2, que se espalha pelo centro-direita do gráfico, combina duras acusações formais com menções à instabilidade política e a possíveis interferências internacionais. A valência predominante é crítica, mas há menções à tentativa de tornar Bolsonaro elegível novamente, o que indica certa ambiguidade ou contraponto. Sua localização sugere um espaço discursivo de tensão, onde se encontram o embate institucional e a disputa política internacionalizada.
O Cluster 3 ocupa uma faixa central, mas com tendência ao quadrante superior esquerdo. Ele se destaca pela polarização explícita: há críticas severas ao STF e ao ministro Alexandre de Moraes, acusações de perseguição e defesa aberta de Bolsonaro. Ao mesmo tempo, menciona insatisfação com Lula e a economia. Esse cluster representa uma defesa ativa de Bolsonaro combinada com críticas ao sistema judiciário e ao governo atual. A posição no gráfico reforça seu papel como polo de contestação ideológica, embora mantenha alguma sobreposição com outros discursos.
O Cluster 4, no centro superior do gráfico, traz à tona novamente as delações de Mauro Cid, agora focando na venda de joias e no papel das Forças Armadas. A narrativa é detalhada e crítica, mas há uma tentativa clara de apresentar argumentos da defesa. Este cluster ocupa um ponto de cruzamento entre o discurso jurídico e as tensões militares, com valência predominantemente crítica, mas com nuances de relativização.
O Cluster 5, mais à direita no gráfico, mantém uma crítica institucional, mas também dá voz à defesa de Bolsonaro e às articulações políticas pró-bolsonaristas, como a tentativa de mudar a Lei da Ficha Limpa. Há ambivalência, mas com forte teor político. A posição gráfica, no quadrante direito inferior, pode ser lida como uma zona de disputa ideológica, em que argumentos técnicos e políticos se misturam.
O Cluster 6 marca uma inflexão mais clara rumo ao discurso bolsonarista. Posicionado no quadrante direito, com valores mais altos de Y, é dominado por retórica provocativa, comparação entre Michelle Bolsonaro e Janja, e a convocação de manifestações. Há críticas ao governo Lula e à economia, além da minimização das acusações judiciais. Trata-se de um cluster de defesa ativa e ofensiva, com valência explicitamente favorável a Bolsonaro.
O Cluster 7, localizado claramente na parte superior direita, expressa apoio inequívoco ao ex-presidente. É o mais alinhado ideologicamente ao bolsonarismo, contendo críticas ao STF, à mídia e ao governo Lula, e reforçando a narrativa de perseguição política. Essa região do gráfico representa o coração da retórica de defesa de Bolsonaro, incluindo esperanças de retorno ao poder e mobilização da base.
Por fim, o Cluster 8, um dos mais amplos, também se encontra na metade superior do gráfico e sintetiza várias tensões em jogo: denúncias formais, planos golpistas, reações políticas e mobilização popular. Ele traz tanto elementos acusatórios quanto tentativas de deslegitimar essas acusações, incluindo pautas como anistia e revogação da inelegibilidade. A valência é ambígua com tendência favorável a Bolsonaro, marcada por discursos de contestação e resistência.
Em conjunto, os clusters revelam que a polarização não está apenas nos temas, mas também no posicionamento discursivo e espacial. Os clusters à esquerda do gráfico tendem a apresentar críticas jurídicas e institucionais a Bolsonaro, com tom mais racional e informativo. Já os clusters à direita carregam narrativas de defesa, provocação e vitimização, com discurso mais ideológico. O eixo vertical parece dividir os conteúdos mais descritivos (em baixo) dos mais retóricos e mobilizadores (em cima), delineando um mapa discursivo da polarização política no Brasil atual.
3. CONCLUSÕES
A análise dos clusters revela que a denúncia contra Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado foi um tema amplamente discutido, mas com narrativas distintas entre os grupos. Enquanto alguns enfatizam o embate jurídico e a legitimidade das acusações da PGR, outros apontam para uma perseguição política e questionam a parcialidade do STF. Há uma clara polarização, com a direita reforçando a tese de injustiça para articular as bases do pedido de anistia e a revogação da Lei da Ficha Limpa, enquanto a esquerda vê a denúncia como um passo necessário para a preservação da democracia.
Esses resultados demonstram como a disputa política no Brasil se desdobra não apenas no campo institucional, mas também nas redes sociais, onde diferentes públicos se mobilizam para influenciar a percepção pública sobre Bolsonaro e seu futuro político. A interseção entre temas jurídicos, mobilização popular e debates ideológicos revela que as estratégias de comunicação e engajamento desempenham papel fundamental na formação da opinião pública, podendo ser decisivas para os próximos desdobramentos políticos no país.
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Expediente
O POLÍTICA NAS REDES publica estudos temáticos sobre o debate política nas redes sociais produzidos pela equipe do Manchetômetro, no âmbito do Laboratório de Estudos da Mídia e Esfera Pública (LEMEP), do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP), da UERJ.
Como os demais projetos do LEMEP, o POLÍTICA NAS REDES conta com o apoio do INCT – Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação.
Apoio:
[1] Utilizamos o número atribuído pelo Crowdtangle. De forma simples, performance é definida dividindo-se as interações obtidas pelas interações esperadas. O número de interações esperadas é igual à média de interações obtidas nos últimos 100 posts. Para mais, ver: https://help.crowdtangle.com/en/articles/2013937-how-do-you-calculate-overperforming-scores